terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Boas festas

(imagem retirada da internet)


Estou out para descanso, volto para o ano.

A todos umas Boas Festas com muita saúde e trancadas das boas.


terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Entrevista de emprego - Parte 1


(imagem retirada da internet)

Já estava desempregada há alguns meses. As minhas poupanças estavam a acabar e eu precisava urgentemente de arranjar um emprego. Tinha acabado de conseguir marcar uma entrevista para um trabalho de secretariado numa empresa de transportes.

Tinha de me esforçar a sério! Tratei de arranjar um conjunto bem apropriado para o trabalho: camisa branca, saia subida com cinto largo e um sapato preto clássico. Cabelo apanhado e uma maquilhagem bem suave. Nada de exageros!

A sede da empresa ficava mesmo no centro de Lisboa. Odiava a ideia de ter de apanhar transportes todos os dias, mas não podia estar a ser exigente agora. Além do mais, nem sabia se iria ser seleccionada.
A entrevista era às 10h, cheguei 20 minutos antes, como é meu hábito, e de bom-tom. Apesar do meu bom hábito, já lá estavam algumas candidatas, supostamente deveriam de ter sido entrevistadas às 9h. Boa…estava tudo à espera. Aparentemente o director dos RH estava preso no trânsito, e bastante atrasado. Ouvi uma senhora que lá andava a organizar aquilo, informar que o Dr. Pereira já tinha entrado no edifício e que iria começar as entrevistas o quanto antes. Fui junto da senhora confirmar a ordem das entrevistas, concluí que era a última de 5 que ele iria entrevistar de manhã, portanto, podia ir à casa de banho à vontade aliviar os nervos.

Quando regressei à sala de espera já tinha entrado a primeira candidata, fiquei aliviada por finalmente ter começado, assim já só faltavam 3 para chegar a minha vez. Queria despachar logo aquilo.
Passados 15 minutos a porta da sala do Dr. Pereira abriu-se e iria sair a primeira entrevistada. Deu para ouvir a voz da pessoa que estava perto da porta…parecia um homem bastante jovem, apesar de ter uma voz grossa. A luz do sol que vinha de dentro da sala não deixava ver nitidamente o rosto da pessoa que estava a porta. Percebi que era jovem, moreno e que estava a olhar para mim, fixamente. Tentei focar melhor a sua silhueta, sem parecer uma velha pitosga. Aquele rosto parecia-me extremamente familiar…

A segunda candidata entrou na sala. O Dr. Pereira fechou a porta, lentamente, e eu de olhos postos nele. Quando esta se estava mesmo quase a fechar, e tapou toda a luz, consegui ver melhor o rosto que me fitava: um sorriso perfeito, aquela boca carnuda. Não podia ser! O meu coração disparou como uma flecha e comecei a suar frio. Levantei-me e fui ao balcão, onde estava a assistente, e perguntei, sem pudores, qual era o primeiro nome do Dr. Pereira, ao que ela me respondeu: “Filipe”. Sorri educadamente e agradeci. Voltei a sentar-me no meu lugar anterior e dei por mim a engolir em seco, a agitar a perna freneticamente e a brincar com os polegares, a desenhar círculos em volta um do outro. Tinha de pensar num plano para me pirar dali, mas ao mesmo tempo estava com a corda no pescoço e precisava de ao menos tentar. Respirei fundo e jurei que ia tentar ficar para a entrevista, ou pelo menos o tempo que conseguisse aguentar até lá.

A segunda candidata saiu da sala, acompanhada por Filipe e ele aguardava, junto à porta, que a terceira entrasse. Fitava-me com aqueles olhos castanhos, aquelas pestanas que lhe davam toda uma profundidade e mistério no olhar, um sorriso disfarçado no canto daquela boca deliciosa. A porta voltou a fechar-se e todo o cenário do nosso primeiro encontro se aflorou na minha cabeça. Toda aquela loucura de dois desconhecidos, aquela fúria com que ele me possuiu contra a porta do quarto do motel, sem mal me deixar entrar e sem ao menos me dizer olá. Senti-me a ficar molhada só de pensar naquele homem com as suas mãos sobre o meu corpo novamente, a percorrer-me com todo aquele desejo. Senti-me arrepiar quando quase pude sentir a sua boca passear-se no meu pescoço, nos meus seios.

(...)

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Nas tuas mãos


(imagem retirada da internet)

Miguel e Sofia já não se viam há cerca de 10 anos. Tinham-se conhecido no tempo da escola, mas os cursos da vida acabaram por se afastar bastante, durante muito tempo. Numa manhã haviam-se cruzado num corredor do centro comercial, cumprimentaram-se alegremente. Tinham algum tempo livre e foram ao café meter a conversa em dia.

Miguel maravilhava-se com os densos olhos verdes de Sofia enquanto esta lhe contava que o marido se encontrava a trabalhar fora do país já há alguns anos. Ele sempre a desejara, mas nunca teve coragem de o dizer, agora ela estava casada…

Trocaram confidências como se os anos nunca tivessem passado, numa rápida conversa de café voltaram a reavivar aquela amizade que sempre tiveram desde a juventude.

Miguel tinha de ir trabalhar e Sofia comprometeu-se a fazer um jantar em sua casa para o receber, ainda nessa semana. Miguel ficou ansioso por receber notícias, e vieram antes do esperado. Nessa mesma sexta ela enviou uma mensagem a convidá-lo para o jantar nessa noite, ele respondeu que levaria o vinho.
Às 20h em ponto ele bateu à porta de Sofia, ela abriu e ele entrou, sem cerimónias, deu-lhe dois beijos demorados no rosto e entregou a garrafa. O jantar estava pronto e sentaram-se à mesa a conversar, sem estranhezas.

Depois de alguns copos de vinho, Miguel continuava perdido nos olhos verdes de Sofia, até que acabou por confessar, por entre alguns pedidos de desculpas, que sempre se sentira atraído por ela, e mais ainda agora que estava ainda mais bonita e elegante. Sofia baixou a cabeça e corou, acabando por confessar que também sempre sentira um fraquinho por ele, mas que se sentia muito mal por ainda o sentir. Era uma mulher casada agora, apesar de  o marido estar longe a maior parte do tempo.

Miguel levantou-se e pegou Sofia pelas mãos, levando-a para a sala, sentiu-a tremer, sentiu que ela, apesar da atracção, não se sentia confortável com aquela situação.

Olhou-a no fundo dos seus olhos verdes, segurou o seu rosto com ambas as mãos, delicadamente, Sofia fechou os olhos e sentiu os lábios molhados de Miguel a tocarem nos seus, suavemente, sem pressas. Sofia entregou-se ao momento e passou uma das mãos por entre o cabelo da nuca de Miguel e correspondeu ao beijo, um pouco mais sofregamente.

Miguel encostou-a à parede, devagar, enquanto continuava a beijá-la e desapertava o seu vestido floral que amarrava atrás do pescoço. O vestido deslizou sobre o busto de Sofia, deixando o peito a descoberto. Miguel não perdeu tempo a contempla-os demasiado, segurou ambos os seios com as mãos e começou a beijá-los. Ele sabia que aquele momento não iria durar muito, nem poderia ir até ao fim, mas tinha de aproveitar enquanto Sofia deixasse.

Ele beijava ambos os seios dela, lambia levemente e sentia os mamilos intumescer dentro da sua boca, enquanto ela, com os olhos fechados, mordiscava o próprio lábio e continuava agarrada aos cabelos da nuca dele, apertando suavemente.

(...)

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Porta de Motel

(imagem retirada da internet)

Conheci Filipe numa rede social. Tínhamos amigos em comum, ele enviou-me um convite e eu aceitei.
Iniciámos a nossa amizade agradavelmente, com conversas triviais sobre os nossos trabalhos, os nossos hobbies, as coisas que gostávamos.

Com o passar dos meses, e de trocas diárias de mensagens, ele começou a abrir-se um pouco mais comigo, e eu com ele. Partilhámos detalhes da nossa vida mais pessoal e amorosa. Era um homem doce, mas profundamente infeliz. A sua mulher estava em depressão há alguns anos, o carinho era pouco e o sexo cada vez mais escasso. Lutava diariamente contra o fogo que o consumia e contra a tentação de lhe ser infiel, pois amava-a muito e tinha esperança que um dia ela voltasse a ser o que era. Satisfazia-se sozinho todas as noites, às vezes mais que uma vez por dia, mas isso não o ia aguentar por muito mais tempo. Optou por começar a dedicar-se intensamente ao desporto, para extravasar a energia acumulada, mas surtia pouco resultado.

As nossas conversas iam ficando cada vez mais íntimas e atrevidas, ele deixava-me louca com as suas conversas envolventes e o fogo que queimava dentro dele, passava o ecrã dos nossos computadores. Chegávamos a passar horas em conversas lascivas, a descrever cenários imaginários, onde nos poderíamos cruzar, a imaginar o que faríamos quando estivéssemos juntos. Trocávamos clips porno com aqueles cenários em que nos tínhamos imaginado mutuamente.

Inevitavelmente, acabámos por trocar algumas fotos íntimas. Comecei, com um pouco de vergonha, por lhe enviar uma foto em soutien, mas ele queria muito mais. Acabou por me convencer a enviar uma dos meus seios nus. Disse que se tinha masturbado a olhar para ela.

Eu já tinha visto uma foto de Filipe. Era um homem bem moreno, lindo, com os seus 29 ou 30 anos, uns lábios tão carnudos que só de olhar dava para sentir uma pulsada lá em baixo. Depois de alguns meses dele estar no ginásio, caí na asneira de pedir outra foto, em tronco nu, para ver a evolução. Ele foi um sacana…enviou uma foto em tronco nu… e algo mais… bem depiladinho… e duro! O desgraçado ainda teve a coragem de dizer que estava assim porque estava a pensar em mim e tinha estado a ver as minhas fotos…fiquei doida!

Antes que começasse a pensar muito, e me arrependesse, mandei uma mensagem: “Amanhã às 20h, no Motel do Sul. Diz à tua mulher que vais jogar à bola…desenrasca-te!” ao que ele apenas respondeu: “OK!”

Fiquei super nervosa, mal dormi nessa noite a pensar no que iria fazer. Demorei horas a escolher a roupa que iria vestir e, sobretudo, a lingerie. Optei por um conjunto branco de renda, uma camisa branca e uma saia preta. Bem clássico, não poderia falhar! Já perto da hora marcada, tomei o meu duche, vesti a roupa, meti-me no carro e rumei ao local marcado. Pensei em chegar um pouco antes de Filipe, para me poder refrescar depois da viagem, mas ele parecia mais ansioso do que eu e acabou por chegar primeiro. Mandou-me uma sms com o número do quarto. Entrei, estacionei o carro perto da porta e bati. Toda eu tremia. Tentei afastar da cabeça todos os pensamentos que eu tinha, de insegurança sobre as expectativas que Filipe teria sobre mim. Pensei também no que raio me teria passado pela cabeça para ter marcado aquele encontro, sem ao menos ir beber um café primeiro. Mas era tarde para pensar nisso. Já estava ali, à porta do quarto, apenas à espera que ela se abrisse e que do outro lado aparecesse aquele que era, tecnicamente, um estranho.

(...)

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Colega de Apartamento - Parte 2

(imagem retirada da internet)

Os dias foram-se passando e a nossa vida retomou o ritmo normal. De vez em quando Pedro despedia-se de mim com um beijo na boca mas fazia tempo que não dávamos uma. Afinal um homem daqueles teria as gatinhas que quisesse a arranharem-se para ficar com ele, sexo não faltava para ele, com certeza.

Sábado à noite era sagrado para ele ir para a noitada e comer umas miúdas boas. Ele arranjou-se todo, perguntou se eu queria ir, e eu, claro, disse que não e desejei que se divertisse. Saiu e eu fiquei ali no sofá a pensar nele, a lembrar-me da queca brutal que tínhamos dado há duas semanas atrás, fechei os olhos e fiquei ali a pensar em todos os detalhes, todas as sensações que havia sentido e não demorou muito para sentir um calor a me invadir e umas palpitações lá em baixo.

Fui para a minha cama, tirei minha roupa e fechei novamente os olhos a pensar nele. Sentia seu perfume perto de mim, passei as mãos pelo meu corpo pensando serem as suas. Belisquei meus mamilos durinhos e pontudos, levei-os à boca e lambi. Não dava para chupar mas conseguia lambê-los. Minhas mãos percorriam meu corpo, minha barriga, minhas coxas grossas e finalmente minha vulva. Já estava completamente molhada e quente, sentia meu coração bater nos meus grandes lábios e meu ritmo cardíaco acelerava.

Comecei a passar a ponta dos meus dedos sobre meus lábios, acariciei-os e afastei-os para tocar meu clítoris. Estava grande e duro, sensível ao toque. Molhei meus dedos em meus sucos e comecei uma massagem em círculos, enquanto que, com a outra mão, apertava meus mamilos. Uma onda de calor começou a invadir-me, meu coração batia mais forte, e eu só com meu pensamento naquele corpo quente em cima do meu, a socar o seu pau maravilhoso dentro de mim. Estava tão concentrada que nem me apercebi de nada, apenas abri os olhos e vi Pedro na porta do meu quarto, a observar-me. Quase morri de vergonha. Puxei o lençol e cobri-me, como se ele nunca me tivesse visto nua. Ele sorriu e entrou no quarto.

- Pensei que tinhas saído. – disse eu, tremulamente.
- Pois, mas desisti de ir e voltei. Amiga se eu soubesse que estavas assim nessa seca, nem tinha saído.
- É… acho que vou ter de comprar um brinquedo – e ri
- Enquanto tu quiseres que eu exista na tua vida, não terás de comprar um brinquedo nunca, eu serei o teu brinquedo.

E imaginem se eu não queria um brinquedo daqueles…

Pedro tirou o lençol de cima de mim, passou suavemente a mão sobre o meu corpo e pediu-me:
- Agora continua o que estavas a fazer, quero ver o que fazes quando estás sozinha.

(...)

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Falha de comunicação

(imagem retirada da internet)


- Eu chego por volta das oito e meia da noite. – responde Ana à sua tia, pelo telemóvel.
- Então vê lá… não te atrases, senão perdes o comboio!
- Não se preocupe, tia. Eu chego a horas.
                Sem dúvida que Ana chegaria a tempo, pois já se encontrava na estação. E pouco passava das treze horas. Ao desligar a chamada, pensa que já está na altura de comer qualquer coisa e largar o telemóvel de vez. De tempos a tempos, continuam a cair mensagens de texto insultuosas, às quais ela não quer responder. Já chega! Não há volta a dar!
                Decide levantar-se do banco frio da sala de espera, pegando na mala de viagem pela mão e na mala de mão pelo ombro e seguindo caminho até ao centro comercial. Não é que a mala esteja pesada, até porque tem rodas e pode muito bem ir a rastejar no chão, deixando para trás memórias que devem estar enterradas. Não é que o lanço de escadas conte muitos degraus para o piso inferior. Não é que Ana esteja fisicamente cansada. Acontece que o facto de ter um elevador a dois passos dá-lhe a vontade de aproveitar para se isolar por uns segundos do resto da população. O que melhor do que um cubículo envidraçado e insonorizado para criar o perfeito isolamento? Ana consegue perceber que a caixa do elevador está neste momento parada no seu piso e aumenta a velocidade para conseguir apertar o botão de chamada, antes que se fosse embora. De óculos escuros e com os cabelos lisos a tapar-lhe parte da visão, nem repara que está em rota de colisão com outro passageiro. Mas a única coisa que vê é o botão. Está a meio metro de distância quando, de repente, embate com o ombro esquerdo naquilo que parecia uma parede de betão, construída em milésimos de segundo. Ao aperceber-se, repara que à sua frente jaz um braço de homem. Levanta os óculos e segura-os na cabeça. Olhando rapidamente para a mão, procura o dedo anelar. Não tem aliança! Não é comprometido! Mas que perseguição! Levanta a cabeça num ápice para deslumbrar o possível otário que a magoaria mais uma vez na sua longa história de dor emocional. Depara-se com uma figura tipicamente portuguesa, de olhos verdes e cabelo escuro, latino, alto e com um físico para o magro. Mas a sua experiência dizia-lhe que por baixo daquela roupa a história era outra… Porra, mas porquê?
                - Peço desculpa, não a vi… - ouve-se.
                Sem ligar muito às palavras, o tom ecoa pelos ouvidos de Ana à velocidade da luz, de tal forma que sente um arrepio nas têmporas. O olhar cola-se à cara dele e deslumbra um meio sorriso junto com um levantar de sobrancelhas que parecia dizer “Vê lá se andas mais devagar!”. Hipnotizante. Não deveria ter mais do que vinte e cinco anos de idade. Era um puto! A realidade leva a melhor e Ana responde, desviando a cara:
                - Não faz mal.
                O dedo dele avança para o botão. Ana acompanha a ponta deste, desejando que lhe tocasse a ela. Não! Por amor de Deus, é um puto! A porta abre-se. Por sorte, o elevador não escapou, tal era a sua utilização… Surpreendentemente, Ana não é convidada a entrar primeiro. Não. É passada à frente por aquele pedaço de homem, de ombros largos, com um rabo empinado, pequeno e arredondado, estúpido de merda, mal educado! Pensou ela. Entra de seguida, esperando que desta vez ele se digne a perguntar “Para que andar?” e que ainda faça o favor de carregar no botão certo. Mas mais vale esquecer. A mais velha é ela, portanto ela é que manda. Atira o indicador para o zero e investe com um olhar prestes a rasgar um sorriso amarelo que diria “Não é preciso. Sei muito bem para onde vou. Sei muito bem quem sou e não preciso que faças nada por mim, porque homens como tu só sabem fazer o mesmo. Por isso, desaparece-me da frente e…” O pensamento de Ana é interrompido pelo olhar verde e exuberante. A lâmpada do elevador está fundida. Não faz mal. Parece que o Sol mudou de morada. Sem retirar o dedo do botão do zero, fixa-se naquele olhar penetrante. Desta vez, o sorriso é maior; tão maior que já se vê uma parte do contorno das gengivas nos dentes. Ainda mais apaixonante para Ana, que já não via um sorriso assim há algum tempo. O rapaz, sem tirar o olhar de cima dela, segue com o dedo para o zero. Os dois dedos encontram-se no botão, roçando pele com pele. Ana sente um arrepio que lhe percorre desde o braço, passando pela espinha e desembocando entre as pernas, provocando uma ligeira contracção. A porta fecha-se. A caixa dá um solavanco, indicando que vai iniciar viagem. É aí que ambos acordam. Os dedos despedem-se, tristemente. E relatam esse sentimento aos olhos de cada um dos protagonistas, que por sua vez baixam o olhar para o piso sujo da caixa. O tempo passa devagar, mais do que o desejado para uma mulher ainda casada encafuada dentro de um cubículo com um universitário insolente. Provocador. Mania que é bom! E deve ter razão…
                Acaba-se a longa viagem no momento em que a porta abre, dando entrada ao ar fresco, frio, gelado da rua, para contrastar com o bafo que se gerou no interior. Parece que o toque dedal transmitiu boa educação ao jovem, porque desta vez esperou que a “senhora” avançasse primeiro. Ana sai, puxando a mala. Sem notar, tal era a pressa para desaparecer daquele momento, passa com uma das rodas da mala por cima do pé do jovem. Este retrai-se, lançando o corpo para trás e recolhendo rapidamente o pé. Perplexo com a falta de reacção da “rapariga”, tomando-a por uma inocente desastrada, diz:
                - Então boa tarde! – esperando um olhar de volta.
                Ana olha muito depressa e sorri, mais ou menos percebendo o que acabara de fazer. Conforme roda a cabeça, volta a colocar os óculos escuros no nariz e segue caminho em direcção ao centro comercial. O rapaz sorri sozinho e segue caminho também. Poucos segundos passam até ouvir, de longe, ecoando na gare:
                - Peço desculpa, não o vi!
                O rapaz abranda o passo, mas a mente ordena-lhe que avance. Ainda olha para o lado, mas já era tarde. Já só via os cabelos lisos a esvoaçar com a pressa.

***

                A montra da loja de perfumes é apelativa, mas o cheiro nauseabundo que se sente naquele corredor faz com que Ana desista de adquirir uma nova fragrância. Queria que tudo fosse diferente a partir daquele dia. O enjoo com o cheiro é cada vez maior e aumenta porque ainda está a digerir a comida de plástico que comera há algum tempo. Pode ser que um café ajude. Arrastando a mala pelo corredor do centro comercial, procura um elevador, pois não quer passar pela vergonha de passear com uma mala de viagem nas escadas rolantes. Para além disso, o espaço está a ficar cada vez mais cheio de pessoas. Tantas pessoas. Demasiadas para o gosto de Ana. Refugia-se no corredor de acesso ao elevador e espera ao lado de uma senhora mais velha, na casa dos sessenta ou setenta. A porta abre-se e a senhora entra. Ana segue-lhe o passo e aguarda que o elevador arranque depois de marcar o dois, de costas para a porta, olhando para as janelas redondas da caixa, que mostravam uma parede colorida com peixes e afins marítimos. Mais afogada do que isto é impossível! Entra mais um passageiro, pelo que de seguida ouve a senhora a dizer:
                - É para o um… se faz favor. – fechando-se a porta. – Tão simpático, sim senhor. Feliz seja a senhora que o tiver ao lado!
                Ana ri-se para dentro, revirando os olhos. Só lhe faltava agora presenciar um engate geriátrico em pleno elevador! Só por causa disso, começou a enjoar de novo com o cheiro do perfume. Já nem sabia se era o dela, o da velhota ou o do velhote. Mas pelo menos um deles cheirava bem. Passaram alguns segundos e a caixa parou. A senhora idosa sai, mas não sem deixar para trás:
                - Bem haja, meu jovem. Bem haja! Muito obrigado!
                As palavras da velhota deixaram Ana a sentir-se enganada. Jovem? Está bem, então. Só por curiosidade, vamos lá ver isso! Ao rodar em tom de inocência, depara-se com uns olhos verdes… O Sol mudou novamente de morada, desta vez para o fundo do mar! Raios partam isto! O puto outra vez! E a porta fecha-se. Não dá para fugir. Ele sorri, como se a conhecesse de longa data e prontamente dirige-se-lhe:
                - Olha quem é ela!... Estava mesmo à sua procura! Sabe, vim agora do hospital… - e silenciou.
                - Eu peço imensa desculpa… - responde Ana, sorrindo e balbuciando. – Foi mesmo sem querer… Mas não o vejo com ligaduras…
                A tentativa de mostrar alguma piada começou a parecer que teria consequências. Não é coisa que se faça em ambientes fechados.
                - Naaa… estou a brincar. – respondeu ele, rindo. – Não foi nada de grave. Acho que sobrevivo.
                E pela primeira vez, Ana sente um pesado remorso e, sem pensar, diz:
                - Eu sei, mas sinto-me mal. Se quiser ofereço-lhe um café. Ia agora beber um…
                - Pode ser. – diz ele, muito rápido. – Calhava bem, agora.
                Ana sorri, pensando que ele iria dizer que não. Queria tudo menos companhia, agora. Mas… porque não? Pelo menos, passava o tempo. Sem mais conversas, chegam ao último piso e dirigem-se, lado a lado, a um dos quiosques de café. Ao contrário do que pensava, Ana vê-se obrigada a sentar numa mesa, após convite do rapaz. Era melhor ficarem em pé no quiosque. Sempre dava um ar mais impessoal. Os cafés são sorvidos lentamente, num silêncio quase perturbador. Ele decide cortar o gelo:
                - Já reparei que vai de viagem. – apontando para a mala.
                - Podia estar a regressar de viagem…
                - Não me parece… para estar aqui a passear… parece que está mais à espera de embarcar.
                - Tens estado a seguir-me?
                - Já nos tratamos por “tu”?
                Ana engole em seco.
                - Ah… pois… desculpa… Aliás!... Desculpe!
                - Ahahah! Não faz mal. Prefiro assim. Também não sou assim tão novo… E você não é assim tão velha… Por isso, prefiro o “tu”. Pode ser?
                - E quem lhe disse que eu sou nova? – ignorando a pergunta.
                - Qualquer um o pode dizer.
                Lisonjeada e a corar, Ana retorque:
                - Saíu-me sem querer… É por teres um aspecto muito novo.
                - Está decidido! É “tu”!
                - Muito bem. Que seja. – mostrando-se superior. – Então e quantos anos é que TU tens?
                - Quantos anos é que me dás?
                - Pronto, lá vem a conversa da treta…
                - Calma, só estou a colocar uma questão pertinente, uma vez que achas que eu sou assim tão novo.
                - Hhmmm… eu diria uns vinte e três… - pensando nos vinte e cinco e terminando com um toque suave. - … mais coisa, menos coisa.
                O rapaz aguardou uns segundos.
                - Aceito. Mas falhaste.
                - Então?...
                - Tenho vinte e oito.
                - A sério?
                - Sim, a sério.
                Ana decide compensá-lo, não tirando o olhar.
                - Eu tenho trinta e três.
                - Não ia perguntar…
                - Mas ficas a saber.
                À medida que o ambiente se vai tornando quente, o olhar de Ana começa a percorrer a multidão, como se procurasse um igloo para se esconder. Ele poderia percorrer o olhar na multidão também, mas prefere fazê-lo em Ana. Subtilmente, vai reparando no decote que insiste em não aparecer por completo sob o casaco comprido que ela veste. Ana retira as mãos de cima da mesa para as colocar sobre as pernas. Sentia-se invadida. Mas o que é que eu estou aqui a fazer com um puto? Quer dizer, parece um puto, mas afinal não é. Pois, afinal não é crime. Ele decide confortá-la:
                - Sou o João, já agora…
                - E o que é que o “João Já Agora” anda aqui a fazer? – retorquiu ela, com um sorriso.
                - Ahahah… que piada… - rindo. – Bem, também vou de viagem… “já agora”!
                - Muito bem…E para onde?
                - Faro. Algarve. E tu?
                - Alentejo.
                João recosta-se na cadeira, comprometido. Indeciso se deveria continuar com o mesmo assunto, prosseguiu conversa:
                - E a que horas é o comboio?
                - Às seis… perto das sete.
                - Mas és de lá? De que cidade?
                - Sim, nasci lá. Mas vivo aqui em Lisboa. – respondeu Ana, evitando olhar de frente.
                - Ok… E vais de férias ou de fim-de-semana?
                Ana aguarda uns segundos e responde:
                - Fim-de-semana. E tu?
                - Eu vim cá em trabalho.
                - Então moras lá, certo?
                - Lá onde?...
                - Em Faro! Não disseste que ias para Faro?
                - Ah, sim! Sim, exacto. Vim cá em trabalho, como disse… e agora vou voltar.
                - Então quer dizer que trabalhas lá…
                - Sim… é isso… Ahahah… que confusão.
                - Não acho confuso, por acaso. E fazes o quê?
                João hesita. Junta as mãos sobre a mesa, aproximando-as da chávena de Ana. E pergunta:
                - E tu fazes o quê?
                Ana ri, lembrando-se de que talvez estivesse, de facto, a falar com um adolescente. Pensou imediatamente que a conversa não teria grande rumo e procurou desligar-se da situação para seguir o seu caminho.
                - Não vale a pena irmos por aí…
                - Disse alguma coisa de mal? – perguntou ele, indignado.
                - Sabes… isto não faz muito o meu género. – confessa Ana, coçando a cabeça, dando um ar mais imaturo. – Não é de mim falar com estranhos assim desta maneira.
                - Há maneira melhor?
                - Não sei…
                - Do que queres falar, então?
                Perplexa com a insistência, mas ao mesmo tempo curiosa, prossegue:
                - Não sei o que há para falar… Se tens essa vontade, sugere tema.
                - És bonita.
                - Eu vou ser o tema de conversa? – ignorando o que acabara de ouvir.
                - Tu, não. Nós.
                - E o que somos nós?
                - Estranhos. Um rapaz solteiro… uma rapariga solteira…
                - E quem te disse que sou solteira?
                - Pelo menos, pareces. Não tens aliança.
                Neste momento, Ana lembra-se da noite anterior. A noite em que retirou a sua aliança do dedo. Para nunca mais voltar a usar. Dez anos de casamento ao ar! Tudo por uma parvoíce! Tem agora a vontade inexplicável de contar tudo a este estranho, vindo do nada. Mas João “salva-a”, continuando:
                - … E não estarias aqui agora comigo, se fosses casada.
                Alinhando na história, Ana segue o rumo:
                - Sim, pois, é verdade. Não sou casada.
                - Então podemos ser abertos e falar do que quisermos.
                - Talvez. Depende do assunto.
                - Eu sugeri falarmos de nós.
                - Então, o que tens a dizer?
                - Tenho a dizer que és uma pessoa que me atrai.
                Ana congela. E João continua:
                - E desde o momento em que choquei contigo que tenho uma vontade louca de te beijar…
                - Tens a noção do que estás a dizer?
                - Tenho. E tu, o que tens a dizer sobre isso?
                - Eu… - balbuciou, sentindo-se confrontada. - … eu não sei o que responder a isso…
                - Tens a mesma vontade?
                Olhando nos olhos de João, surpresa por tão grande frontalidade, Ana quase que fica sem palavras. Mas resiste e tenta alinhar na conversa.
                - Talvez tenha essa vontade… não teria nada a perder.
                - Eu também não teria nada a perder. Seríamos ambos a ganhar. – insiste João, com um olhar sedutor e com um sorriso maroto. – Resta saber se queres…
                - Este não é o sítio mais apropriado… - defende-se Ana.
                - Então qual é?
                Chega o momento de Ana fazer uma muito breve avaliação da sua vida. Sim? Não? Que se lixe! Porque não? Nunca mais o vou ver, de qualquer maneira. E faço o que quero.
                - Vamos sair daqui? – levantando-se da cadeira e pegando de novo na mala de viagem, que agora já estava a começar a estragar a situação.
                João segue-a de lado.Olha-a, vislumbrando como quem olha para um troféu de outros tempos. Ana está determinada a deixar-se levar pela situação, mesmo não sabendo bem o que fazer sobre isso.

***

                Estão já demasiadas pessoas a circular no centro comercial. Este facto começa a tornar-se demasiado incómodo para ambos. Ana sente que João agora está mais tímido. Aquela conversa de engate à macho revelou-se só conversa, mesmo. No fim de contas, era um puto que ela tinha à frente. Com a testosterona em alta. Pois, então porque não aproveitar isso? Dar uns beijos ou umas apalpadelas ao rapaz fazê-la-ia sentir-se renovada, como se estivesse a saldar uma dívida. Uma dívida com o Diabo. Seria pecado? Sentiria remorso depois? Ele não a conhece, ela não o conhece. E já que agora é uma mulher livre, pelo menos na teoria, não há nada a perder.
                Seguem pelos corredores do centro. Incomodado com o silêncio entre os dois, João pergunta:
                - É suposto irmos onde?
                - Boa pergunta… Ainda estou a pensar no que fazer…
                O rapaz tenta pegar na única mão livre de Ana. Esta aceita, mas por poucos segundos. Sorri, para compensar. João interrompe o passeio, coloca-se à frente de Ana e insiste:
                - Vamos tornar isto mais interessante. Pode ser?
                - O que tens em mente?
                - Queres ir ver as modas? – apontando para uma boutique próxima.
                - Pode ser. – responde Ana, sorrindo.
                Ana achou que João estava lentamente a esquecer o assunto e a querer dá-lo como uma simples conversa pecaminosa entre dois estranhos. A verdade é que a tensão aumentava. Na loja, ela começa por apreciar algumas peças. Deslumbrando uma saia, olha para João, como se perguntasse directamente a opinião dele, levantando as sobrancelhas. Como resposta, ele olha para uma área contígua, onde era exposta a lingerie da colecção. Ao aperceber-se, Ana ri. João sugere que ela experimente uma saia, apontando para uma área oposta.
                - Já estou a ficar farta de andar com a mala para todo o lado… Segura aqui. – Passando a pega da mala para João e pegando na saia.
                Em modo precipitado, dirige-se aos provadores. Achou que estaria a provocá-lo. Quem sabe se ele não daria uma investida ali mesmo? Não sabia, mas era um bom teste. Oh! Como ela o desejava! Ao entrar no provador, despe-se à pressa, tirando as calças que trazia vestidas. Rapidamente, veste a saia, magicando a postura que envergaria ao sair do provador para mostrar ao seu “amado”. Começa a treinar poses sensuais em frente ao espelho. Dobra-se ligeiramente para alisar a saia com as mãos. Ao levantar a cabeça, vê pelo reflexo a cabeça de João a espreitar pela cortina. Apanhada de surpresa, mantém uma cara séria. Ouve-se a pouca distância:
                - O senhor precisa de ajuda? – pergunta uma funcionária da loja, indagando o aparente“voyeur”.
                Virando-se para trás, este responde:
                - Estou com a minha mulher. Obrigado.
                A funcionária sorri, acenando com a cabeça, e volta para trás. Ana, espantada com a resposta, e ao mesmo tempo excitada, puxa João pelo casaco para dentro do provador e fecha de novo a cortina. Do lado de fora, apenas se vê uma mão a transportar rapidamente a mala de viagem para dentro do provador. Por poucos segundos, olham-se nos olhos. João estende os lábios para os de Ana. Deixando-se envolver, esta agarra-o pela cintura. Agora és meu. Faz o que tens a fazer e vai-te embora! As bocas envolvem-se, cada vez mais molhadas. Espera!... Não te vás ainda embora! Continua o que estás a fazer! João encosta as mãos ao separador dos provadores. Ana passa as mãos para o rabo dele, abraçando a cintura, agarrando-o como quem agarra as barras de protecção de uma montanha-russa. O rabo é mesmo empinado! Enquanto que o beija, afasta-o ligeiramente com as mãos, agora à frente, despindo acima das calças o suficiente para conseguir tocar-lhe na barriga. Enfia o polegar no umbigo que se apresenta nú à sua frente e começa a percorrer o tronco, fazendo a mão sair na gola e conseguindo tocar no pescoço. Com a outra mão, agarra o cabide de parede por cima da sua cabeça. Ele aproveita para lhe beijar o pescoço, enquanto que ela se contorce de prazer. A mão passa a descer pelo tronco até à cintura, fazendo uma tentativa de entrar por dentro das calças. O que ela procurava, rapidamente encontra, pois já se coloca “fora do seu lugar”. Decide ir mais fundo e colocar a mão inteira dentro das calças, chegando a conseguir tocar na virilha de João com a ponta dos dedos. Tem a certeza da excitação do parceiro quando sente o pulso com uma certa… humidade. João agarra-a pela perna, levantando-a e apalpando todo o contorno dos glúteos de Ana.
                Subitamente, ele pára e olha nos olhos dela. Sorri. Ela mantém a cara séria. Porque é que paraste? Quem é que te mandou parar?
                - Posso perguntar-te uma coisa?
                - O que foi? – retorque Ana, sentindo-se incomodada com a interrupção.
                - Como é que te chamas?
                Em vez de responder, Ana puxa-o pela cintura das calças, com metade da mão do lado de dentro e beija-lhe a cara e o pescoço, impedindo-o de voltar a falar. Enquanto que desempenhava o seu papel carnal, Ana começa a indagar sobre a parte emocional. Não querendo ferir a susceptibilidade de João, responde, quase murmurando:
                - Joana…
                A reacção do rapaz não passa despercebida, pois agarra-a com mais intensidade, voltando a cobrir-lhe o pescoço com beijos, mesmo com os cabelos que já se metiam no meio e que perdiam cada vez mais a compostura. Diz ele, então, pausadamente:
                - És… mesmo… boa… Joana…
                É neste momento que se ouve um toque de telemóvel. Dentro de Ana acontece uma falha de energia. Em poucos segundos, a excitação vai-se. Evapora-se. Já não são faíscas e choques orgásmicoso que ela sente. Agora é só um estranho a tocá-la. Ele pensa que eu sou outra pessoa. Onde estou? O que estou a fazer? Será do telemóvel ou do que ele disse? João sente a lenta paragem e decide acalmar os ânimos. Não retirando o olhar de cima dela, beija-a como se fosse o primeiro beijo, como os de cinema. Um beijo apaixonado. Ela não reage. Mas sorri, como forma de agradecimento, e trinca o lábio inferior, mostrando satisfação. João afasta-se lentamente enquanto que arranja a roupa meio despida. De seguida sai do provador e aguarda do lado de fora, puxando consigo a mala de viagem de Ana.

***

                Já não falta muito tempo para o comboio. Quase uma hora. Enquanto que passeiam na gare fria e ventosa, Ana tenta esconder-se dos olhares das outras pessoas. Não quer ser vista com ele. Mas como é um sítio tão populoso, talvez passem despercebidos. Mesmo assim, o incómodo está presente e decidem esperar pelo comboio num local mais abrigado. Refugiam-se para o fundo do corredor inferior, onde se sentam.
                - A que horas é o teu comboio? – pergunta Ana.
                - Daqui a pouco. – responde João, com alguma tristeza.
                - Gostei de estar contigo. – agradece ela, sorrindo.
                - Eu estou a adorar estar contigo.
                O silêncio predomina e torna cada vez mais difícil reatar a conversa. Mas João, insistente e demonstrando interesse, pergunta:
                - Queres ficar com o meu número?
                - Para quê?
                - Não sei… Talvez nos possamos encontrar um dia destes.
                - E porque é que tu irias querer isso?
                - Penso que fui bem claro no provador…
                - Sem dúvida… - responde Ana, em tom provocador e a rir.
                - Tu também não foste nada má…
                Ana abre a boca em tom de estupefacção ao mesmo tempo que sorri em tom jocoso. Bate com a palma da mão no peito dele, empurrando-o para trás. Não era esse o desejo dela, muito pelo contrário! O que ela queria era puxá-lo novamente e que ele a possuísse ali mesmo. Salta para cima de mim, bonzão! Mostra o que vales! João agarra-a pelo braço e aproxima-se, rindo, para lhe beijar a boca. Ana muda a atitude, retraindo-se e dizendo:
                - Aqui não…
                - Oh… vá lá… - João com cara triste.
                - Não… já chega…
                - Mas eu quero…!
                - Sim, mas eu não quero. Pára com isso.
                - Vá lá! – insiste João. – Quero despedir-me…
                - Já disse… aqui não…
                João levanta-se e puxa Ana pelo braço com uma mão e pela mala de viagem com a outra. Ela insiste em dizer “não”, mas deixa-se levar, rindo pelo caminho. Entram por uma porta de acesso a um parque de estacionamento. Numa zona mais escondida, canto escuro, ao lado de uma viatura, encostam-se à parede e repetem algo parecido com o que fizeram antes no provador da loja. Mas desta vez, João está encostado à parede. No seguimento dos beijos e apalpadelas, Ana começa a desapertar o cinto de João, ao mesmo tempo que dá uma panorâmica no parque de estacionamento, garantindo que ninguém estava por perto. Já lhe desapertou o botão das calças. A braguilha também é de botões. Desapertar um a um? Nem pensar! “Zás”! As mãos de Ana já percorrem toda a zona íntima de João, que por sua vez encosta uma mão à parede e outra ao carro estacionado, enquanto que ela se baixa, colocando-se quase de joelhos de frente para ele. João sente o calor da boca de Ana no seu pénis e fecha os olhos, com uma expressão de contentamento. A respiração torna-se mais ofegante, soltando alguns gemidos de prazer em tom baixo, para não chamar as atenções. Nunca pensou em estar num sítio daqueles a fazer aquele tipo de coisas. Ana delicia-se com o momento, agarrando-o com uma mão e segurando-se com a outra na perna de João. E o telemóvel volta a interromper…
                - Merda para isto! – resmunga Ana, abrindo a mala de mão e, olhando para o visor do telefone, repara que recebeu mais uma mensagem de texto.
                Desta vez, desliga o som do mesmo. Pensando em qual seria o insulto que iria ler, decide não abrir a mensagem. Entretanto, a vontade que tinha esmoreceu. A vontade de continuar a “comer” aquele gajo! Levanta-se. Olha para ele em tom de perdão. João entende e, sem palavras pelo meio, dá-lhe um beijo terno, vestindo-se de seguida. Aproveitando para não deixar o ambiente ainda mais constrangedor e percebendo que se tinha distraído, pergunta:
                - Reparaste que horas são?
                - Hã… Acho que são seis e meia… Temos que…
                - Foda-se! – interrompe João. – Perdi o comboio!
                - O teu comboio era agora?!... Porque é que não disseste nada?
                - Desculpa… Estava tão fixado em ti que nem dei por isso…
                - Tem calma. Não consegues apanhar outro?
                - Não. Tinha reservado para este. É sexta-feira… Duvido que consiga apanhar outro. Mas não faz mal. Vou de carro.
                - De carro?
                - Sim… Não há problema. Dinheiro não é problema. Alugo um carro e pronto.
                - Ok… Tu é que sabes…
                Ana sentia-se culpada pela situação, embora se tentasse mostrar indiferente. Respirou fundo e contornou o carro para sair do canto escuro. João puxa-a de volta, agarrando-a pela cintura, com o intuito de a abraçar. Sem dizer nada, Ana tenta soltar-se.
                - Joana… - chama ele por ela.
                Ao ouvir aquele nome falso, Ana enche-se de fúria e solta-se com força dos braços de João. Sem se lembrar que a sua mala de viagem estava no meio do caminho, entre o carro e a parede, e dada a pouca visibilidade que tinham naquele canto, tropeça sobre a mala, estatelando-se no chão, encostada à viatura. João acorre a levantá-la.
                - Estás bem? – pergunta.
                Por acaso, nem se magoou. O pior mesmo era a mancha de óleo que jazia no chão, provavelmente do carro que ali estava. Pior ainda… as calças completamente mascarradas! Recorre aos lenços que tira da bolsa para limpar as mãos. Olhando para a sua triste figura, Ana depressa tira da mala um saco… com a saia que havia comprado na loja. Não tinha tempo para escolher outra peça de roupa. Era o que estava à mão! E tinha de correr para o comboio! Sentindo-se inútil para ajudá-la, João passa para uma área mais visível, vigiando a zona envolvente. Vira-se para trás e avisa:
                - Despacha-te, antes que apareça alguém.
                - Eu sei! Eu sei! – geme Ana, apressando-se a trocar de roupa.
                Em pouco tempo, os dois saem daquele sítio. João acompanha Ana até ao piso superior para levá-la ao comboio, arrastando a mala. Ana tira-lhe a mala da mão e ultrapassa-o. Olha rapidamente para ele e diz, sem parar o passo:
                - Obrigada por tudo… - e avança a correr, deixando-o para trás.
                Sobe as escadas rolantes, saltando os degraus o mais que podia. A saia nova ainda não estava ajustada ao corpo! A mala parece mais pesada agora! Merda! Os degraus inferiores não deixam a mala subir à mesma velocidade! A falta de força nos braços faz com que Ana largue, sem querer, a pega da mala, ao tentar puxá-la para cima. O efeito acaba por ser o contrário. Ana vê a sua a pega da mala retrair e esta a cair pelos degraus abaixo. Sem saber o que fazer, dado que os degraus continuam a subir mas a mala parece querer descer, olha para cima e para baixo. Um dos transeuntes que passava no topo, apercebendo-se da situação, acorre a carregar no “stop” de emergência das escadas rolantes.
                - Não! – grita Ana.
                E as escadas param imediatamente. Sem agradecer, pois pensava que a mala poderia ficar parada num dos degraus e subir de volta, desce as escadas para ir de encontro ao seu pertence e trazê-lo de volta. Feito isto, volta a subir, carregando-o ainda com mais esforço, degrau a degrau. Tem ainda mais um lanço de escadas. Não rolantes. Subindo cada degrau como se a sua vida disso dependesse, chega ao último da gare correspondente à linha de saída do comboio apenas para ver este já de portas fechadas, a circular. Ao passar a última carruagem, os cabelos ainda esvoaçam. Suspira. Olha para o chão. Surgem junto aos seus pés uns sapatos de homem. Ao seu lado, um respirar ofegante. João.

***

                Passou pouco desde as sete da noite. Ana está confortavelmente sentada numa poltrona da loja do “rent-a-car”. João está do lado de fora, a falar ao telemóvel. Supõe que poderá estar a dar alguma satisfação à família, como é lógico. Vai chegar mais tarde a algum compromisso que poderia ter. Mas foi simpático o suficiente para assumir uma parte da culpa e insistir em dar boleia a Ana para o Alentejo. Já que ficava no caminho. Ela não recusou. João pareceu entusiasmado assim que ouviu “Évora” sair da boca de Ana como sendo o seu destino de viagem. Era pior se fosse para outro ponto do país! Nesse caso, não lhe poderia dar boleia! E agora, para além de se sentir prestável, ainda podia usufruir da companhia dela durante mais algum tempo. Mas ela estava mais concentrada a pensar em toda a situação. Em ter-se deixado envolver num engate daqueles e perder o último comboio para Évora. De facto, cada um perdeu o seu comboio. E tudo por causa do tempo que perderam na diversão.
                - Devemos chegar a tempo, se formos depressa. – diz ele, entrando na loja. – Vamos, o carro está estacionado no parque.
                Em alguns minutos, estão a sair. Rumo ao Sul. E agora não há mala para arrastar. João conduz. Ana olha pelo vidro, ainda a pensar como foi parar àquele assento. Nem repara na cara de feliz que João exprime. Mas predomina o silêncio entre os dois.
                O traço descontínuo da auto-estrada vai passando rapidamente. Os olhos de Ana já estão cansados. O mesmo cenário. Já é altura de olhar para o outro lado. Ao virar a cabeça, observa o rapaz. Bonito. Atraente. Só agora é que repara nas feições dele. Sorri para dentro. Subitamente, é apanhada em flagrante. João sorri-lhe de volta.
                - Desculpa por isto tudo. – diz ele. – Não foi propositado, mas por outro lado… ainda bem.
                - Pois… Podia ter sido pior.
                - Mas continuo a adorar a tua companhia.
                Ana não responde, mas ele prossegue:
                - Agora que estou a levar uma estranha num carro que não é meu… Ou seja… Uma vez que estamos em território neutro… - e silencia.
                - Sim? – pergunta, curiosa.
                - Queres dizer-me o que fazes da vida?
                Ana suspira e acede.
                - Sou advogada.
                Sente o telemóvel a vibrar. Desta vez não é uma mensagem de texto. É uma chamada! Retira o telefone da mala e atende. Era a sua tia Rosa. João aguarda pelo fim do discurso.
                - Sim, tia… já estou no comboio. – olha para João e deita a língua de fora, fazendo este rir silenciosamente. – Não, não é preciso! Eu apanho um táxi na estação. Não se preocupe, eu tenho a morada. Até logo, então.
                Desliga.
                - Bem, já percebi que não vais para Évora em trabalho. – afirma João, convencido.
                - Pois não. Vou visitar a família. Pensei que isso me faria bem, largar o trabalho por uns dias. Infelizmente, o meu trabalho é sempre no mesmo sítio. O mesmo já não se pode dizer do teu.
                - Ah, pois não! Eu ando sempre cá e lá.
                - E não me chegaste a dizer o que fazias… - indaga ela. – Tivemos uma falha na comunicação…
                - Sim, pois foi. Então, trabalho numa empresa de importações e exportações. Sabes como é… Negócios, viagens, hotéis, aviões, comboios… - recosta-se para o lado dela com a cabeça. - … ou a perda deles.
                Ri-se, mas não obtém resposta igual. Esperava que Ana compactuasse e achasse piada à situação. Mas não era o caso. Tenta animá-la, puxando cada vez mais pela conversa.
                - E casar?... Um dia destes?
                - Não tenho tempo para pensar nisso.
                - Bonita como és… não seria difícil.
                - Olha, não queres mudar de assunto?
                - Pronto, desculpa. – responde ele. – Não queria ofender. Só te estava a querer dizer que uma mulher como tu deve ter potenciais interessados…
                - Não tenho tempo para amar.
                João surpreende-se com a afirmação e decide investir noutro nível.
                - Mas tens tempo para fazer amor… - insinua, apertando a língua com os lábios.
                - Toma mas é atenção à estrada.
                - Só preciso de uma mão para segurar o volante.
                Silêncio.
                Continua o silêncio.
                Lentamente, João debruça a mão direita sobre a perna de Ana. E ela permite, embora um pouco incomodada. A mão vai puxando muito lentamente a saia para cima e passando os dedos por entre as pernas, vai afastando-as. Ana deixa-se levar, fechando os olhos. Já os dedos dele tocam na roupa interior. Se não fosse aquele pequeno pedaço de tecido, estariam a penetrá-la. Mas estes dedos são mais capacitados do que ela pensava e rapidamente contornam o bloqueio, puxando-o e invadindo a parte interior. Já estão a entrar. Ana agarra o cinto de segurança com força, apertando-o contra si. João masturba-a lentamente, provocando-lhe arrepios. Já não está totalmente sentada, pois a cintura faz força para se levantar. Com cada vez mais intensidade, os dedos percorrem o interior da vagina, estimulando todos os sentidos de Ana, fazendo-a ofegar e gemer. Não muito tempo até ela fazer sinal para interromper, pegando-lhe no pulso. João olha para ela, sorri, retira os dedos e encosta-os aos seus próprios lábios, lambendo-os. De seguida, trinca os lábios de prazer, voltando a olhar de frente para a estrada. O telemóvel está a tocar, mas desta vez ninguém o ouve. Continua com o som desligado, apenas a vibrar. Prosseguem caminho, em silêncio. Só a cabeça de Ana não está em silêncio. Algo a incomoda.

***

                Falta pouco para chegar a Évora. A auto-estrada ficou para trás há um bom bocado. Já é noite. João parece ansioso. Ana sente isso e pede-lhe para parar o carro. Estacionam perto de umas casas. Suspirando, ela dobra-se no banco, afaga o cabelo, levanta a cabeça e observa o rapaz. Suspira novamente.
                - Vou ter de ser sincera contigo…
                Ele, mostrando-se interessado, sorri e agarra na mão dela. Ana retrai-se e interrompe qualquer movimento, começando a discursar.
                - Espera, deixa-me falar. – e prossegue pausadamente. – Quero que saibas que estou-te muito agradecida por me teres dado boleia para cá. Nunca pensei que hoje fosse acontecer o que aconteceu, mas espero que não leves isto em conta, pois não significa nada. Eu e tu não somos nada…
                - Joana… - interrompe.
                - Não! Deixa-me falar! Eu não… - aguarda uns segundos e prossegue. – Eu não estou solteira… ainda. Até há uns dias atrás, estive casada com um homem. Quer dizer, ainda sou casada, mas para mim aquilo terminou…
                - O que aconteceu? – voltou ele a interromper.
                - São coisas da vida… és muito novo para entender… Casámo-nos muito cedo, fartámo-nos muito cedo um do outro, acabámos por seguir vidas diferentes, mais por causa do trabalho… Ele empenhou-se demais no trabalho, se calhar eu também… Éramos duas pessoas muito diferentes a viver na mesma casa. E mal nos víamos. Ah! Sim… E eu não sou advogada. Sou empresária e tenho a maior parte do meu tempo ocupado.
                - Percebo… - murmura o rapaz, com um ar mais comprometido.
                - Talvez percebas, não sei… Mas quero que vejas isto como uma coisa que aconteceu e que não voltará a acontecer. Nunca me vi numa situação destas. Gostei, sim. Mas ficamos por aqui.
                - Eu entendo e também vou ser sincero contigo. Espero que não fiques chateada…
                Ana acena com a cabeça e deixa-o falar.
                - Eu também gostei muito de estar contigo e sei que não poderei voltar a estar… Porque tenho namorada…
                Não muito surpreendida, Ana pergunta:
                - E ela estava em Lisboa, certo?
                - Não. Ela está em Faro… à minha espera. Fui telefonar-lhe a dizer que vou visitar os meus pais a casa…
                Ana interrompe.
- Pronto, tudo bem. É a tua vida. Eu não preciso de saber, portanto não precisas de me dizer. Eu é que me estava a sentir mal com a situação. A verdade é que a história com o meu marido não ficou resolvida. Envolvi-me contigo porque não tinha sexo há muito tempo. Há anos, por acaso. Achei-te um rapaz muito giro e atraente e agarrei-me ao momento. Mas foi só isto… Desculpa…
- Não tens de pedir desculpa. O porco aqui sou eu. Eu é que tenho uma relação boa e ando a tentar estragá-la, não sei porquê… Talvez por tédio…
- E tens tempo para isso? Pareceste-me ser muito ocupado…
- Também não fui verdadeiro contigo nesse aspecto… Eu nem sequer trabalho… Sou estudante em Faro, na universidade.
- O quê?! Mas que idade é que tu tens? – pergunta Ana, exaltada.
João respira fundo e responde:
- Vinte e três…
Ana revira os olhos e suspira.
- Bem… está provado que isto foi um erro. É melhor irmos embora daqui.
- Espera… Tenho mais uma coisa para te dizer…
- Não! Não quero ouvir mais nada. Desculpa, mas é melhor ficarmos por aqui, mesmo. Guardamos isto para nós e continuamos com a nossa vida.
- Mas eu gostava de voltar a ver-te… Ou pelo menos, poder falar contigo…
- Mas porquê? Somos estranhos um para o outro!
- Eu sei! Mas gostei mesmo de ti, de te conhecer… Não é o sexo que me interessa, mas sim o que tu és… E quero o melhor para ti… Acho que és metade do que dizes… E muito mais do que pensas…
- Desculpa, João, mas é melhor irmos embora.
- Mas deixa-me ao menos…
- Não! – interrompe Ana. – Vamos, por favor! A estação é já ali à frente.
O rapaz cala-se e acata a ordem. Ana não deixa de pensar na “metade do que ela seria”… Será que ele percebeu que o falso nome que ela lhe teria dito era mais do que o seu verdadeiro? Mas nem era bem metade… Raios partam o puto! No que eu havia de me meter… Questionou-se se deveria dizer o seu nome. Concluiu que não. Não valia a pena.
Alguns minutos depois, chegam perto da estação e Ana faz sinal para ele parar antes. Ao encostar, Ana mete a mão à porta para sair. Respira fundo.
- Aponta o meu número. Diz-me depois se chegaste bem…
O rapaz, sorrindo, pega no seu telemóvel e guarda o número que lhe é indicado e com o nome Joana. Ela sai, olhando para João com um leve sorriso. Abre a porta de trás para tirar a mala de viagem, fecha a porta e segue pelo passeio, sem voltar a olhar para o carro, dirigindo-se a uma praça de táxis. João ficou parado, dentro do carro. Observou Ana a entrar num táxi e seguir caminho. Ainda com o telemóvel na mão, decide telefonar.
                Dentro do táxi, Ana sente o telefone a vibrar. Lembra-se então que poderia ser a tia Rosa a tentar saber onde ela estaria. Ao pegar no telefone, este desliga-se. Pudera, com tantas mensagens do Mário a entrar! Aquele estúpido! Deve estar tão arrependido! Mas Ana não teve tempo de ver sequer quem lhe estava a ligar.
                Finalmente, a casa da tia Rosa! A fome já aperta, mas a vontade ir à casa de banho é maior. Até vai parecer mal, entrar assim em casa da senhora, que não vê há quase vinte anos e pedir logo para usar a sanita! Ah! A tia Rosa… Aquela mulher da família, sempre disposta a ajudar o próximo, a única que deitou a mão a Ana. Não fosse a mãe desta ir logo a correr contar sobre o divórcio da filha assim que soube. Foi o que motivou a viagem de Ana a Évora, cidade que não visitava desde criança. Estar com a família, da qual estivera sempre afastada, desde que os pais se mudaram para Lisboa. Foi a própria tia Rosa que sugeriu que a sobrinha viesse passar uns dias ao Alentejo. E era mesmo disso que Ana estava a precisar!
                Sai do táxi em direcção à porta de entrada. Bate à porta e em pouco tempo a sua tia a recebe com todo aquele típico acolhimento português, ignorando por completo o motivo da visita, pois ninguém tem nada a ver com isso. O que interessa é que a sobrinha Ana veio para ficar uns dias e espairecer com os ares alentejanos. Após toda a calorosa recepção, com o tio a falar muito alto e os primos de braços cruzados a olhá-la de alto a baixo, Ana pergunta à tia onde é a casa de banho. Mas não sem antes lhe pedir para ligar o telemóvel a uma tomada para carregar um pouco. Ao entrar no compartimento, senta-se na sanita e respira fundo, pensando no dia que teve, na experiência que passou. Agora tudo parece tão rápido. Começa a rir-se sozinha, lembrando-se de alguns pormenores mais sórdidos. A pele dele. As mãos dele. Aquele rabo! Todo ele perfeito. Mas não neste mundo. Não no meu mundo. A memória é tão insistente nos pormenores, que Ana consegue sentir o perfume de João, tal e qual como sentiu no elevador do centro comercial. Ainda consegue sentir o cheiro dele nela própria. Lava as mãos, olhando-se ao espelho. Já fiz a porcaria. Já me vinguei. A partir de agora: vida nova.
                Prepara-se para sair, ouvindo o reboliço que páira na sala. Metade da aldeia está a chegar para ver a rapariga! A mesa está servida para cerca de dez pessoas. Ainda não é hoje que vai haver paz!... Abre a porta e vira para o corredor onde, em cima de uma pequena mesa, está o telemóvel a receber carga. Liga-o. Lembrou-se que não tinha ficado com o número do rapaz, sentindo uma enorme vontade de lhe pedir novamente desculpa. Esperava, portanto, por uma mensagem dele quando este chegasse a Faro.
                No ecrã aparece informação de trinta e duas mensagens por ler e de meia dúzia de chamadas não atendidas. Ao abrir a lista de chamadas, repara que as últimas foram da tia Rosa e todas as outras do estúpido do Mário.
                - Tia Rosa, tentou ligar? – grita Ana do corredor.
                A tia não responde e Ana decide, calmamente, aceder à caixa de entrada de mensagens de texto. São todas do Mário. Mário. Mário. Mário. Mário. Mário… Excepto a mais recente. De um número que ela não tem guardado. É dele! É o João! Eu sabia!
                Caminhando pelo corredor muito lentamente enquanto que lia a mensagem, ignorando o barulho que vinha da sala, com tanta gente à mistura e tudo em tom de festa, a tia Rosa vai passando por ela várias vezes, transportando os tachos de um lado para o outro e respondendo.
                - Sim, tentei há um bocado…    
“Joana, não consegui aguentar e tinha de te dizer alguma coisa agora. Estou neste momento sentado no carro e não consigo sair daqui sem te dizer isto…”
- … mas parecia que ficaste sem bateria, porque a chamada foi abaixo…
“Foste muito especial para mim e não quero que penses que quero algo sério contigo. Como te disse, tenho namorada e nem para ela sou fiel…”
- … ainda pensei em ligar outra vez, mas pensei logo que devias estar a chegar…
“Fui a Lisboa para me encontrar com uma rapariga que conheci pela net, mas nem aconteceu nada porque arrependi-me e quis voltar para Faro…”
                - … depois a tua prima Célia ligou a dizer que chegava atrasada…
“Não me deixaste falar no carro, mas eu ia dizer que os meus pais são daqui de Évora e vou aproveitar para ficar aqui este fim de semana para a minha namorada não desconfiar…”
                - … e olha! Nem imaginas! O teu primo Jorge também ligou a seguir porque veio cá para nos ver este fim de semana…
                               “Espero que fiques bem e que digas qualquer coisa quando te apetecer…”
- … deve estar aí a chegar, diz que veio agora do Algarve.
“Já agora… quero que saibas que o meu nome verdadeiro é Jorge. Beijos… por esse corpo todo.”
                Alguém bate à porta. E Ana já sabe quem vai entrar por ela. Agora sabe.

                O tempo congela. Tudo parou de repente. Apenas a mente de Ana está a funcionar, a tentar perceber.

escrito por: "Tuga"